sábado, 8 de novembro de 2008

Como um peixe fora de água salgada


Um peixe marinho que parece estar à beira de se adaptar à vida em água doce está a lançar luz sobre a forma como algumas espécies conseguiram fazer essa transição evolutiva no passado.

Ao contrário do salmão e de algumas trutas, que conseguem sobreviver tanto em rios como no mar, a maioria dos peixes apenas consegue viver num desses ambientes.

Mas pescadores do Maine começaram a descobrir um peixe marinho conhecido como peixe-escorpião Myoxocephalus octodecimspinosus em estuários, levando Kelly Hyndman e David Evans, zoólogos da Universidade da Florida em Gainesville, a decidir analisar melhor a situação.

Colocaram os peixes em aquários contendo diferentes concentrações de água salgada e, após 24 e 72 horas, mediram as concentrações de sódio, potássio e cloro no sangue, bem como os níveis de três proteínas nas guelras que ajudam a regular a presença desses iões. As três proteínas são a Na+/K+-ATPase, uma cotransportadora de sódio, potássio e cloro e reguladora da condutância transmembranar da fibrose quística, vulgarmente conhecida por bomba sódio-potássio.

A equipa relata na última edição da revista Experimental Zoology que mesmo em água doce, o peixe-escorpião produzia a mesma quantidade das três proteínas que produzia em água salgada. A incapacidade do peixe de regular o número destas proteínas torna mais difícil a sua sobrevivência em água doce a longo prazo.

"Tanto quanto sabemos esta é a primeira vez que a barreira fisiológica que impede os peixes marinhos de entrar em água doce foi identificada", diz Hyndman.

Mas estranhamente, a análise das amostras de sangue revelou que ainda que o peixe numa mistura de 10% de água do mar e 90% de água doce estivesse a perder estes iões para a água salobra, aqueles que estavam em concentrações de água salgada de 20% ou mais, já não tinham esse problema e podiam ter sobrevivido indefinidamente.

A osmolaridade, a concentração de iões como o potássio, sódio e cloro, da água salgada a 20% em que os peixes foram imersos era de 190 milimoles, ou apenas 56% da do seu sangue (340 milimoles). A diferença devia significar que os sais saíam do peixe, levando à sua morte. "Ficámos espantados com o facto de o peixe ser capaz de manter uma osmolaridade do sangue constante nestas condições", diz Hyndman.

A equipa sugere que existem outras proteínas que trazem iões para dentro do corpo de forma a compensar o fluxo de saída e que os seus rins também devem impedir a perda de iões.

O peixe-escorpião deve estar à beira de passar para água doce, à medida que as pressões selectivas, como os predadores de água salgada, o empurram para aí. Tal como os peixes marinhos devem ter originado novas espécies de água doce, essas devem ter começado por se deslocar para os estuários salobros. 

"Acho que apanhámos uma espécie nos primeiros passos de inventar, por evolução, uma melhor forma de se adaptar à água doce", diz o biólogo William Marshall, da Universidade St Francis Xavier em Antigonish, Canadá, que não esteve envolvido no trabalho.

Os salmões e a truta, apesar de serem capazes de sobreviver em água doce e salgada, não devem ser bons modelos fisiológicos dos peixes que fizeram a transição definitva, diz ele.

"As espécies estuarinas são oportunistas, muitas espécies conseguem tolerar água salobra mas fazem-no através de mecanismos fisiológicos pouco convencionais", diz Marshall. "Apesar de ser muito ineficiente sobreviver em água salobra bombeando activamente (como o peixe-escorpião parece fazer), ainda parece beneficiar a espécie se o local tiver menos predadores." 


Fonte: Simbiotica


 

Saber mais:

David Evans

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