quarta-feira, 4 de novembro de 2009

Dopamina é a molécula da vez, como a serotonina foi nos anos 90

Natalie Angier
The New York Times
Fernanda Goulart

Se você já teve problemas com roedores, como acordar no meio da noite e descobrir que ratos haviam comido boa parte do pacote de cereal, das bolachas de chocolate, do macarrão instantâneo e até a caixa de fermento de pão que havia comprado com tanto desejo, você vai ficar admirado com o camundongo de laboratório que não tem nenhuma motivação para comer.


O camundongo é fisicamente capaz de comer. Ele também gosta do sabor da comida. Ao colocar ração em sua boca, ele mastiga e engole, e, enquanto isso, mexe seu nariz demonstrando uma satisfação evidente.


Porém, quando deixado sozinho, o rato nem sequer acordará para o jantar. O simples fato de ter que atravessar a gaiola e pegar a comida da sua tigela o enche de preguiça. Para que comer, se depois tudo será excretado? Para que se incomodar? Dias se passam, o rato não come, ele quase não se move, e em poucas semanas, morre de fome.


Por trás do caso fatal de tédio do roedor, encontra-se um déficit severo de dopamina, uma das moléculas essenciais de sinalização no cérebro. A dopamina está na moda, é o neurotransmissor famoso de hoje, assim como a serotonina do Prozac era nos anos 90.


As pessoas falam em obter “o efeito de dopamina” do chocolate, da música, da bolsa de valores, dos celulares da moda – enfim, de tudo o que possa trazer uma leve sensação de prazer. Agentes viciantes como a cocaína, a metanfetamina, o álcool e a nicotina são conhecidos como estimuladores dos circuitos da dopamina do cérebro, assim como fazem os estimulantes cada vez mais populares como o Adderall e a Ritalina.


De modo geral, a dopamina age como uma recompensa, gerando sentimento de bem-estar e o desejo de sentir isso novamente. Se você não se cuidar, ficará viciado, um escravo do prazer que dirige o seu cérebro. Por que você acha que eles a chamam de dopamina?


Novas pesquisas em camundongos com deficiência de dopamina revelam que a imagem que temos da dopamina como nossa “Deusa do prazer” está errada, exatamente como a antiga caricatura equivocada da serotonina como um rosto feliz.


Nas concepções atuais, discutidas no encontro da Sociedade para Neurociência, realizada na semana passada em Chicago, a dopamina tem menos a ver com prazer e recompensa do que com impulso, motivação, descobrir o que você tem para sobreviver e, dessa forma, agir. “Você chamaria de prazer o fato de estar com falta de ar e ter que respirar rapidamente para conseguir ar?” disse Nora D. Volkow, pesquisadora que estuda dopamina e diretora do Instituto Nacional em Abuso de Drogas. “Ou quando você está muito nervoso e come alguma coisa nojenta, isso é prazeroso?”



Segundo Volkow, em ambas as respostas, a respiração profunda em busca de oxigênio e o consumo de algo que você geralmente rejeitaria, os caminhos da dopamina do cérebro estão bloqueados. “O cérebro tem uma atitude”, disse ela. “O impulso intenso de tirá-lo de um estado de privação e mantê-lo vivo”.


A dopamina também faz parte do filtro de saliência cerebral, como um aparelho detector. “Você não consegue prestar atenção em tudo, mas você quer ser um perito em reconhecer as coisas que são novas” disse Volkow. “Pode ser que você não perceba um mosquito na sala, mas se ele fosse fluorescente, suas células de dopamina disparariam.”


Além disso, o detector de saliência do impulso de dopamina focará em objetos conhecidos que consideramos importantes, sejam eles positivos ou negativos, ou seja, objetos que desejamos e objetos dos quais temos medo. Se amamos chocolate, nossos neurônios da dopamina irão provavelmente disparar ao ver um pequeno pedaço chocolate. Por outro lado, se detestamos baratas, esses mesmos neurônios podem disparar ainda mais intensamente quando vemos uma. Contudo, o gosto prazeroso do chocolate ou a ansiedade e fobia pela barata podem ser o trabalho de outras moléculas sinalizadoras, como os opióides ou os hormônios do estresse. A dopamina simplesmente faz com que um objeto relevante seja impossível de ser ignorado.


Se o cérebro decidir ignorar o que em outra situação ele notaria, a dopamina deve estar inibida. Em um relato, recentemente publicado na Nature Neuroscience, Regina M. Sullivan, do Centro Médico Universitário de Nova York e Gordon A. Barr, do Hospital Infantil da Filadélfia, e seus colaboradores descobriram que enquanto os ratos com mais de 12 dias rapidamente desenvolvem aversão a qualquer odor que estivessem conectados com um choque elétrico leve, ratos jovens mostravam uma preferência por tal odor se sua mãe estivesse por perto quando o choque fosse dado. Os pesquisadores vincularam essa coragem a uma inibição da atividade de dopamina na amígdala, onde nascem as memórias do medo. Ratos infantis conhecem suas mães pelo cheiro, explicou Sullivan, e eles devem aprender a não evitá-la, pois mesmo uma péssima mãe é melhor que nenhuma.


Apesar do grande impacto que possa ter, a dopamina é uma molécula compacta, formada por 22 átomos, com o característico grupo de amina nitrogenada em uma das pontas. A propósito, o nome dopamina vem de sua composição química, e nada tem a ver com a palavra dopa- como na heroína ou outras drogas – que derivam do termo holandês referente a estado de agitação.


As unidades de produção da dopamina são pequenas também. Menos que 1% de todos os neurônios produzem o neurotransmissor, a maioria delas no cérebro intermediário, como a substância negra, que ajuda a controlar o movimento. É a degradação da população das células de dopamina que resulta nos tremores e outros sintomas do Mal de Parkinson.


Há também atividade de dopamina no córtex pré-frontal, logo atrás da testa, a parte administrativa cerebral onde as tarefas são traçadas, os impulsos controlados e as desculpas formuladas. Uma diminuição da dopamina pré-frontal pode contribuir para a esquizofrenia.


Onde quer que elas se encontrem, as células cerebrais respondem à liberação de dopamina por meio cinco receptores de dopamina distintos, que ativam a molécula. Outro agente importante é o transportador do composto, um tipo de zelador que pega as moléculas de dopamina usadas e as coloca de volta nas células onde foram geradas. Drogas como a cocaína tendem a bloquear esse transportador, permitindo que a dopamina permaneça por mais tempo ativa na entrada neuronal.


A ligação da matriz da dopamina, a velocidade com que os neurônios de dopamina são ativados ritmicamente, a atividade que cada célula responde às necessidades e as novidades, e as facilidades com que as células hiperestimuladas retornam ao seu estado inicial se diferem em cada pessoa.


Alguns pesquisadores têm investigado variações genéticas nos tipos de receptores que poderiam explicar essas diferentes respostas entre os seres humanos. Segundo Dan T.A. Eisenberg, da Universidade Northwestern, os cientistas já detectaram uma conexão modesta entre a versão prolongada do receptor de dopamina número 4, e uma tendência a comportamentos de impulsividade e de risco, principalmente riscos financeiros.


Esses resultados ainda não fornecem muitas informações sobre a relação entre genética e comportamento, porém, seria interessante que na próxima crise os banqueiros fossem testados para a presença de receptores de risco. É a economia, dopamina.



do UOL Ciência

sexta-feira, 23 de outubro de 2009

Novo fóssil põe "elo perdido" sob suspeita

REINALDO JOSÉ LOPES
da Folha de S.Paulo

Um grupo independente de cientistas analisou o fóssil de primata propagandeado em maio deste ano como "o elo perdido" da evolução humana e chegou a uma conclusão não muito empolgante: o bicho é provavelmente só um primo antigo e esquisito dos lêmures.

Se eles estiverem corretos, o alarde midiático organizado em torno de "Ida, o elo perdido", ou Darwinius masillae, como o animal foi batizado oficialmente, pode se tornar um dos casos clássicos em que a vontade de chamar a atenção do público atropelou a ciência.


Reuters
Fóssil alemão da espécie _Darwinius masillae_, apelidado de Ida, cuja ancestralidade em relação ao homem está em xeque
Fóssil alemão da espécie Darwinius masillae, apelidado de Ida, cuja ancestralidade em relação ao homem foi colocada em xeque

Afinal, a descrição científica de Ida foi coreografada com o lançamento de documentários, sites, livros e de um evento para a imprensa no qual os pesquisadores responsáveis por estudá-la compararam o fóssil com a Mona Lisa e com o Santo Graal, afirmando que ele mudava tudo o que se sabia sobre a evolução humana.

Devagar com o andor

À época, boa parte da comunidade científica concordou que se tratava de um exemplar belíssimo. Diferentemente dos outros primatas antigos, Ida, com quase 50 milhões de anos de idade, teve seu esqueleto completo preservado --sem falar na presença de pelos e até do conteúdo digestivo do animal. Mas poucos concordaram com a sugestão de que o fóssil representava um ancestral direto dos antropoides, a linhagem de macacos que acabou desembocando no homem.

No novo estudo, que está na revista científica "Nature" desta semana, a equipe coordenada por Erik Seiffert, da Universidade de Stony Brook (EUA), compara Ida a uma nova espécie de primata extinto descoberta por eles no Egito.

Trata-se do Afradapis longicristatus, que é 10 milhões de anos mais novo que o suposto elo perdido, mas, ao que tudo indica, é um parente próximo de Ida, a julgar pela análise detalhada da mandíbula e dos dentes da espécie africana (aliás, esses são os únicos materiais preservados do bicho).

Seiffert e companhia também compararam Ida, o novo primata e outras 117 espécies vivas e extintas de primatas, levando em conta uma lista de 360 características do esqueleto. Essa comparação extensa, que não foi feita na descrição original de Ida, ajuda a estimar quais traços dos bichos realmente se devem ao parentesco e permite montar uma árvore genealógica dessas espécies.

O veredicto: Ida seria apenas uma prima muito distante do grupo que inclui o homem, estando bem mais perto dos lêmures atuais. As semelhanças superficiais dela com o grupo dos antropoides seriam explicadas por evolução convergente --ou seja, porque ambos os grupos adotaram estilos de sobrevivência parecidos.

Comedora de folhas

"São características relacionadas ao encurtamento do focinho e ao processamento de alimentos relativamente duros, como folhas", explica Seiffert. O pesquisador aponta o que, para ele, foi o principal erro da equipe que descreveu Ida.

"Acho que eles deveriam ter feito comparações mais detalhadas com os mais antigos antropoides indiscutíveis. Eles teriam visto que traços como a fusão das duas metades da mandíbula, que não aparecem nesses antropoides [mas aparecem em Ida], não poderiam ser um elo entre Ida e eles."

Philip Gingerich, paleontólogo da Universidade de Michigan e um dos "pais" de Ida, não concorda. "Acho esquisito que o Afradapis seja muito parecido com os antropoides, mas acabe classificado em outro grupo. A ideia de convergência parece implausível", diz ele.

Aliás, argumenta Gingerich, "o Darwinius [Ida] conta com um esqueleto muito mais completo que o do Afradapis, e ele apresenta características adicionais de primatas avançados que não aparecem na análise".

Nasa acha molécula orgânica em planeta fora do Sistema Solar

Atualizado às 12h52.da Folha Online

Pesquisadores da Nasa (agência espacial norte-americana) anunciaram a descoberta de química básica para a vida em um segundo e novo planeta quente e gasoso, muito distante do nosso Sistema Solar. Feito na terça-feira (20), o anúncio da pesquisa também informa que isso permite aos astrônomos avançar quanto a identificar planetas onde a vida possa existir.

O planeta, que leva o nome de HD 209458b, não é habitável, mas possui a mesma química que, se encontrada em um planeta rochoso no futuro, pode indicar a presença de vida.


Nasa
Química básica para a vida foi encontrada no exoplaneta HD 209458b (na foto, em concepção artística)
Química básica para a vida foi encontrada no exoplaneta HD 209458b (na foto, em concepção artística)

"É o segundo planeta fora do nosso Sistema Solar em que água, metano e dióxido de carbono foram encontrados --elementos importantes para processos biológicos em planetas habitáveis", disse o pesquisador Mark Swain, do Laboratório de Propulsão a Jato da Nasa. "A descoberta de componentes orgânicos nos dois exoplanetas já traz a possibilidade de que será corriqueiro encontrar planetas com moléculas que podem ser vinculadas à vida."

Os pesquisadores usaram dados de dois observatórios em órbita: os telescópios espaciais Hubble e Spitzer, para estudar o HD 209458b --que, além de quente e gasoso, é gigante (maior do que Júpiter) e orbita em uma estrela semelhante ao Sol por volta de 150 anos-luz de distância da Terra, na constelação de Pegasus.

Sequencial

A descoberta segue a uma outra, ocorrida em dezembro de 2008, que mostrou a presença de dióxido de carbono (CO2) em outro planeta do tamanho de Júpiter, o HD 189733b. Observações anteriores do Hubble e do Spitzer também tinham revelado que o planeta contém água em vapor e metano.

Para rastrear as moléculas orgânicas, a Nasa usou espectroscópios, instrumentos que dividem a luz em componentes para mostrar a "assinatura" de diferentes elementos químicos. Dados da câmera infravermelha do Hubble e do espectrômetro de multiobjetos mostraram a presença de moléculas, e dados do fotômetro e do espectrômetro infravermelho do Spitzer mediram as respectivas quantidades.

"Isso demonstra que nós podemos identificar as moléculas importantes nos processos de vida", disse Swain. Os astrônomos podem, a partir de agora, comparar as duas atmosferas de ambos os planetas, pelas diferenças e similaridades. Por exemplo: as quantidades de água e dióxido de carbono relativas a ambos os planetas são similares, mas o planeta HD 209458b mostra ter metano em abundância, quando comparado com o HD 189733b. "A alta abundância de metano está nos dizendo alguma coisa", disse Swain. "Pode significar que houve algo especial sobre a formação deste planeta."

"A detecção de compostos orgânicos não significa necessariamente que há vida em um planeta, porque existem outras formas para a geração destas moléculas", disse Swain. "Se detectamos compostos químicos orgânicos em um planeta rochoso como a Terra, nós vamos entender o suficiente sobre o planeta para descartar processos sem vida que poderiam ter conduzido os elementos químicos até lá."


quinta-feira, 15 de outubro de 2009

Aranha vegetariana torce nariz a dieta carnívora

@ BBC

Uma aranha que se alimenta quase exclusivamente de plantas foi descrita pela primeira vez pelos cientistas. É a primeira aranha predominantemente vegetariana que se conhece, de todas as 40 mil espécies já descritas, que são essencialmente carnívoras.

A aranha Bagheera kiplingi, que vive na América central e México, evita a tendência carnívora das suas primas banqueteando-se com acácias, como relatam os investigadores na última edição da revista Current Biology.

A aranha-saltadora, com 5 a -6 mm de comprimento, desenvolveu um gosto pelas extremidades dos ramos de acácia, conhecidos por corpos beltianos, extremamente ricos em proteínas. Mas para alcançar o seu manjar vegetariano, a aranha tem que escapar à atenção indesejada das formigas, que vivem nos espinhos ocos da árvore.

As formigas e as acácias evoluíram conjuntamente para formar uma relação mutuamente benéfica: as formigas agressivas protegem as árvores de predadores, atacando os invasores, e, em troca do seu serviço de guarda-costas, as formigas empanturram-se elas próprias dos corpos beltianos produzidos pelas acácias.

Mas a habilidosa aranha Bagheera kiplingi descobriu uma forma de explorar esta relação simbiótica.

Um dos autores do estudo, Robert Curry, da Universidade Villanova na Pennsylvania, explica: "As aranhas basicamente despistam as formigas. As aranhas vivem na planta, mas longe, nas extremidades das folhas velhas, onde as formigas não passam muito tempo pois não há praticamente alimento nessas folhas."

Mas quando ficam com fome, as aranhas encaminham-se para as folhas novas e preparam-se para enfrentar a horda de formigas furiosas.

Curry continua: "E esperam por uma aberta, observam os movimentos das formigas e se elas andam pela zona que têm como alvo. Se está tudo limpo, correm, agarram um corpo beltiano, cortam-no e fogem com ele na boca. Retiram-se para uma das zonas não defendidas da acácia e comem calmamente."

Como muitas outras espécies de aranhas-saltadoras, a Bagheera kiplingi tem uma visão apurada, é especialmente rápida e ágil, pensando-se que tem inclusivé boas capacidades cognitivas, que lhe permitem 'caçar' o seu alimento vegetariano.


A dieta herbívora da aranha foi descoberta pela primeira vez na Costa Rica em 2001 por Eric Olsen, da Universidade Brandeis, e posteriormente observada de forma independente em 2007 por Christopher Meehan, na altura estudante da Universidade Villanova. Seguidamente, a equipa colaborou para descrever a aranha pela primeira vez neste artigo na revista Current Biology.

Curry refere que ficou extremamente surpreendido quando descobriu este comportamento invulgar. "Esta é a única aranha que conhecemos que deliberadamente apenas se alimenta de vegetais."

Ainda que algumas aranhas ocasionalmente suplementem a sua dieta com um pouco de néctar ou pólen, a dieta da Bagheera kiplingi é quase completamente vegetariana, apesar de ocasionalmente complementada com alguma pequena larva de formiga.

Segundo Curry, há várias razões para o motivo porque esta aranha se terá afastado das refeições carnívoras: "A competição nos trópicos é feroz logo há vantagens em fazer o que mais ninguém está a fazer. Elas são aranhas-saltadoras logo não constroem teias para apanhar alimento, têm que perseguir as presas. Ora os corpos beltianos não fogem logo são uma fonte de alimento muito previsível."

As acácias também produzem folhas todo o ano, mesmo na estação seca, o que as torna atraentes como fonte de alimento. Curry acrescenta: "Como as acácias são protegidas pelas formigas, não têm nenhuma das defesas químicas que a maioria das outras plantas tem."


Fonte: Simbiotica

Blog da Terra